sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

MINHA VIDA PEQUENINA




Minha vida pequenina
não tem grandes dramas
nem grandes prêmios,
tragédias ou heroínas.

É divertida, mas minimalista.

Tem o básico de viver e de sonhar.
O cenário é todo emprestado
no palco onde transcorre
meu ato de representar.

De meu mesmo quase nada:
talvez a paixão e o humor
que me marcaram desde a estreia.

Minha vida pequenina é muito simples.
Mas a plateia, meu Deus, a plateia.

(do livro O exercício das pequenas delicadezas)


quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

OUTRAS MÃES





Chove. É verão.
Minha casa está limpa
e eu tenho pão.

O céu escurece na tempestade.
Minha casa tem luz
e eu respiro liberdade.

A natureza se exalta com trovões e raios.
Minha casa está segura
e daqui não saio.

Não saio porque não preciso
um trabalho e salário dignos
me garantem esse destino.

Mas quantas heroínas anônimas
foram  necessárias
para abrir esse caminho.

Em seus vestidos longos e escuros
só com os braços dados por escudo
marchando contra os preconceitos

e do escárnio, do ferro e do fogo
moldando corajosamente o rosto
da mesma mulher, mas com direitos.

Chove. É verão.
Minha casa está limpa
e eu tenho pão.

O céu escurece na tempestade.
Minha casa tem luz
e eu respiro liberdade.

Ergo-lhes um cálice, agradecida.

Quem sempre teve isso jamais entenderá
que além de minha mãe
foram essas mulheres que me deram a vida.



quarta-feira, 22 de janeiro de 2014

POEMINHO À LA QUINTANA





Cuido para não molhar a janela da vizinha
mas que não me voe o poema
da folha que coloquei na soleira
para secar a água que transbordou
do vaso da palmeirinha.

Mas se voarem não tem problema;
não a folha que está bem presa
mas as letras que estão no papel.

Talvez soltas ao léu, em afinada algaravia
me revelem outro poema
que ali estava e que eu não sabia.

sábado, 21 de dezembro de 2013

O TEMPO



O tempo é uma ilusão com hora marcada.
Sua brevidade tem esquinas inesperadas
onde a todo instante vida e morte
trocam olhares de reconhecimento.

Seguimos sem nos dar conta do movimento
até que a casa começa a ficar em silêncio
e a mão que servia está cansada
do peso da eternidade provisória que lhe foi dada.

O tempo é o senhor do esquecimento.
Sua passagem desde sempre nivela
toda a humanidade ao que de fato é:
pó que fica ao longo da estrada.

Perguntas, para que, enfim,
essa caminhada louca.
E eu te mostro no jardim
aquelas buganvílias brancas.

                               Liane dos Santos 

Menção Honrosa no Concurso OFF FLIP 2009, Paraty/RJ, publicado na Antologia do Concurso, a ser lançada em 2010.